Conselho Municipal de Políticas Culturais de Itabuna denuncia descumprimento da lei do Fundo de Cultura e falta de política efetiva
A cultura em Itabuna vive um momento de alerta. O Conselho Municipal de Políticas Culturais de Itabuna (CMPCI) vem denunciando uma série de irregularidades e omissões que afetam diretamente a execução das políticas culturais municipais. No centro da crítica está o descumprimento da Lei Municipal nº 2.281/2014, que criou o Fundo Municipal de Cultura (FMC) — instrumento essencial para garantir financiamento público permanente para projetos, grupos e artistas locais.
Apesar de a lei estar em vigor há mais de uma década, o repasse orçamentário previsto para o Fundo não foi contemplado na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2025. Isso significa que, na prática, o Fundo não está sendo executado neste exercício, impedindo a abertura de editais municipais e a manutenção de ações culturais com recursos próprios da cidade.
Essa denúncia foi encaminhada formalmente ao Ministério Público, em documento protocolado pelo próprio Conselho, apontando a inobservância da legislação municipal e a ausência de dotação orçamentária específica. A lei determina que o município destine entre 0,02% e 0,5% da receita corrente líquida ao Fundo, valor que deveria constar na LOA e ser repassado regularmente — o que não ocorreu.
📌 Fundo Municipal de Cultura: lei no papel, vazio no orçamento
Criado em 2014, o Fundo Municipal de Cultura deveria garantir uma base sólida de fomento às artes e à cultura de Itabuna. No entanto, mais uma vez, a lei não saiu do papel.
No ano passado, a Prefeitura fez ampla divulgação pública sobre a ativação e regulamentação do Fundo, com discursos, eventos e anúncios oficiais. Porém, em 2025, essa mesma gestão não destinou recursos orçamentários efetivos, contrariando a legislação que ela própria celebrou.
Essa prática — de transformar instrumentos legais em peças de marketing político — descredibiliza a política cultural e mina a confiança da classe artística. Divulgar a lei e não executá-la é, na prática, negar o direito cultural previsto por ela.
Aldir Blanc 2: adesão anunciada, repasse adiado
Outro ponto de preocupação é a Política Nacional Aldir Blanc (PNAB). Itabuna aderiu formalmente ao segundo ciclo (2025–2029), mas, por não ter executado o mínimo exigido de recursos do primeiro ciclo dentro do prazo determinado pelo Ministério da Cultura, o município ficou fora da lista de habilitados para receber os repasses do ciclo 2 neste ano.
Na prática, isso significa que os recursos do ciclo 2 só deverão ser repassados em 2026, prejudicando o calendário de ações culturais locais. Enquanto outras cidades já planejam novos editais, Itabuna ficará um ano sem esse reforço federal — consequência direta da gestão ineficiente dos prazos e da execução tardia dos recursos do ciclo 1.
Ou seja: não há recursos municipais, e os recursos federais, que poderiam amenizar a situação, também foram perdidos temporariamente por falta de execução adequada. O município só irá receber em 2026.
Essa situação já havia sido denunciada anteriormente em um texto publicado neste blog, no qual abordamos o descumprimento do ciclo 1 da PNAB em Itabuna. Clique aqui Falha na execução do ciclo 1 da PNAB
Sem plano, sem sistema efetivo e com pouco diálogo
A situação é agravada pela ausência de um Plano Municipal de Cultura efetivo. Embora existam instrumentos do Sistema Municipal de Cultura formalmente instituídos — como o próprio CMPCI e leis correlatas —, Itabuna não possui um plano de cultura consolidado, com metas, indicadores e estratégias de longo prazo.
Na prática, as decisões culturais ficam concentradas na figura do gestor da Fundação Itabunense de Cultura e Cidadania (FICC), que define ações segundo sua visão pessoal e imediata, sem um planejamento participativo estruturado.
Além disso, há relatos constantes de falta de diálogo entre a gestão da FICC e o CMPCI, o que enfraquece o controle social e a construção democrática das políticas culturais. O Conselho tem cumprido sua função de denúncia, fiscalização e proposição, mas não tem sido devidamente ouvido ou envolvido nos processos decisórios, o que contraria os princípios do Sistema Nacional de Cultura.
Um padrão de descaso: falta de fomento real
A soma desses elementos desenha um quadro preocupante:
Não há execução do Fundo Municipal de Cultura em 2025, embora a lei exija;
A cidade ficou temporariamente de fora dos repasses da Aldir Blanc 2, por falha de execução no ciclo anterior;
Não existe um plano de cultura efetivo, capaz de orientar políticas públicas de forma duradoura;
O diálogo entre gestão e sociedade civil é frágil, e muitas decisões são tomadas de maneira centralizada;
As denúncias chegaram ao Ministério Público, sinalizando que o problema ultrapassou os limites do debate interno.
Na prática, Itabuna não possui hoje um mecanismo consistente e contínuo de fomento cultural municipal. Os grupos, artistas, produtores e coletivos seguem dependentes de iniciativas pontuais e recursos eventuais, sem segurança orçamentária, previsibilidade ou planejamento.
Cultura não é vitrine — é política pública
O CMPCI, ao denunciar essas omissões, cumpre seu papel institucional: fiscalizar, cobrar transparência e defender a efetividade das leis culturais.
Mas a responsabilidade não é apenas do Conselho. Cabe ao Executivo Municipal cumprir a legislação, dotar o Fundo de recursos, executar os programas federais dentro dos prazos e construir políticas públicas culturais com base no diálogo e no planejamento.
Itabuna tem leis, instrumentos e agentes culturais potentes. O que falta é vontade política real para fazer com que a cultura saia das solenidades e entre no orçamento — onde realmente faz diferença.
Cobranças urgentes:
Execução imediata da Lei do Fundo Municipal de Cultura, com dotação orçamentária e calendário de repasses claros;
Regularização e execução completa dos recursos Aldir Blanc 1, garantindo habilitação e recebimento do ciclo 2;
Elaboração de um Plano Municipal de Cultura participativo, com metas, prazos e orçamento vinculado;
Fortalecimento do diálogo com o CMPCI e a sociedade civil;
Transparência plena: publicação detalhada das dotações, execuções e editais culturais no Portal da Transparência.
A cultura de Itabuna não pode continuar refém da vontade política momentânea. É hora de transformar leis em ações e discursos em políticas públicas reais.